1 - INTRODUÇÃO:
Escrevo aqui algumas orientações histórico-teológicas que visam continuar a estabelecer parâmetros ao Avivamento Espiritual que tem se instalado em nosso meio e que, cremos nós, por obra do Espírito Santo de Deus. No entanto, em seu meio tem surgido práticas, sentimentos, aspirações e orientações que necessitam ser orientadas. Algumas, inclusive, necessitam mesmo serem mudadas, por carecerem da base bíblica.
Estas orientações visam, portanto, nos ajudar a crescer em um Avivamento Espiritual Metodista que seja maduro e que produza, junto ao fervor espiritual, compromisso missionário real, produzindo assim visível mudanças nas comunidades onde Deus nos tem colocado.
2 - O QUE É UM AVIVAMENTO ESPIRITUAL?
Sem ter ambição de esgotar as possibilidades de resposta a esta pergunta, trato de responder o que é essencial do ponto de vista teológico. Certamente um historiador, ou mesmo um sociólogo teria outra abordagem ao responder, mas como teólogo e Bispo apresento minha interpretação.
Um avivamento é um movimento dado pelo Espírito Santo, e que inspirado nos fatos ocorridos com a Igreja primitiva, a partir do Pentecostes busca por nova vida e vigor espiritual nas pessoas, estruturas e instituições da Igreja e mesmo da sociedade em geral.
Devem ser parâmetros para um Avivamento Metodista os seguintes momentos da vida da Igreja:
2.a - A vida e o ministério de Jesus.
O nascimento de Jesus e posteriormente seu ministério ocorrem num quadro histórico onde a religião aliara-se ao dominador estrangeiro, visando garantir seu lugar e relevância, mesmo que para isto tivesse de trair o povo, reconhecendo e legitimando o invasor estrangeiro a uma dominação e exploração que o leva a suspirar por uma visitação do Deus Libertador. Vejamos alguns dos elementos deste quadro histórico do Ministério de Jesus.
Esta demarcação - Galiléia - é importante e significativa em todos os sinóticos. Marcos escreve: "...Jesus foi à Galiléia..."( Mc 1:14). Lucas enfatiza o poder do Senhor "...Jesus voltou para a Galiléia cheio do poder do Espírito Santo..."(Lc 4:14). Mateus escreve semelhantemente a Marcos, apenas muda o verbo, diz ele: "...Jesus retirou-se da Galiléia..."(Mt 4:12).
A Galiléia na época de Jesus era território de Herodes Antipas, o qual dominou até 39 d.C. Sua economia era centrada basicamente na agricultura, embora o comércio ocupasse um lugar de destaque, visto que as rotas de caravanas de comerciantes cruzaram suas terras através da famosa "Via Ápia".
Começar na Galiléia significou que Jesus fez uma adesão parcial, era a terra das tensões e conflitos sociais responsáveis por rebeliões e lutas que desde a dominação dos Selêucidas sacudiram toda a terra de Israel, principalmente a Galiléia.
As razões de tais conflitos são várias. Mas as principais foram a dominação da terra por grandes proprietários estrangeiros, somada ao sistema de impostos que transferiu a legítima produção da terra para as mãos dos dominadores e donatários do poder político, os quais eram os romanos, Herodes e seus partidários e a oligarquia do Templo. Isto redundava no crescente empobrecimento do povo da Galiléia, apesar das riquezas naturais amplamente suficiente para o sustento do povo. A questão do domínio da terra por grandes latifundiários é testemunhada pela parábola dos lavradores maus (Mc 12:1-2), a qual, à parte interpretações, mostra claramente o conflito social na Galiléia.
Quanto aos impostos pagos aos romanos, eles eram de 25% da colheita da cada ano, além disto havia cotas para a alimentação das tropas romanas de ocupação, mais múltiplos pedágios. Somemos a isto o dízimo do Templo e mais ofertas alçadas, temos o quadro das tensões já mencionadas. Com isto a Galiéia viu crescer o número de enfermos, desempregados e lavradores sem terras.
Quando lemos que as multidões seguiam Jesus (Mc 3:7), estas eram compostas por pobres e famintos, vítimas da estrutura econômica e política estabelecida em Israel (Mc 8:1-20.
Não há dúvida de que este estado de coisas gerou uma adversidade de privilegiados, os Herodianos que achegados a família de Herodes usufruíam do que hoje chamamos de mordomias, entre os quais citamos: "as famílias dos Boetos e que por influência de Herodes Magno chegaram ao supremo pontificado, em 22 antes de Cristo."Outros ligados a administração romana sediada em Cesaréia marítima e depois em Jerusalém e finalmente os controladores do Sinédrio, ambos da tendência saducéia. Em contraposição a estes privilegiados, temos a grande maioria de população vivendo em "terrível pobreza" como nos diz o estoriador judeu Baron em sua clássica "Histoire d' Israel, vie sociable et religieuse".
A resposta de Deus começa com um profeta que renunciara o Templo ou seja João Batista. O Avivamento tem início com a chamada ao arrependimento e a conversão à Deus e ao anúncio da vinda do Reino (Mt 3:2). Jesus dá prosseguimento a isto, seu ministério tem início após a descida do Espírito Santo sobre ele, no momento do Batismo. A função do Espírito Santo é marca fundamental de João Batista e do filho de Deus, Jesus Cristo, de tal modo, é claro, que a mensagem de Jesus retoma a pregação de João Batista, pois Jesus também prega o arrependimento, convoca a conversão à Deus e anuncia a chegada do Reino de Deus (Mc 1:15).
São marcas do Avivamento de Jesus, além da pregação sobre a vinda do reino, o confronto com os espíritos malignos, conforme descrito na primeira visita de Jesus em Cafarnaum (Mc 1:23), além disto o sinal da cura da sogra de Pedro (Mc 1:30-31), e muitas outras curas marcam o ministério de Jesus (Mc 1:32-34). Juntamente com isto a contestação de tradições religiosas que tornavam-se mais importantes que o ser humano, por exemplo, o sábado (Mc 2:23-28). A luz disto, Jesus passa a serviço do povo sofrido em suas necessidades, e eles passam a confiar nEle, porque vêem nEle os sinais do poder de Deus.
2.b - A vida e o Ministério da Igreja Primitiva.
Já tenho afirmado, de muitas maneiras, que a tarefa da Igreja Primitiva era a de dar prosseguimento ao Ministério de Jesus,de anúncio do Reino. Vede como exemplo o envio dos discípulos em Mateus 10:1-15, ou Marcos 6:7-13. O texto de Mateus é claro: "... e, à medida que seguirdes, pregai que está próximo o reino dos céus. Curai enfermos, ressuscitai os mortos, purificai leprosos, expeli demônios; de graça recebestes, de graça dai." (Mt 10:7-8).
A Igreja que nasceu em Pentecostes teve tudo isto, conforme vimos no estudo que escrevi para o Promissão. Mas quero chamar a atenção para o fato, havia nesta Igreja uma preocupação total com a espiritualidade e com o social, com o bem-estar das pessoas (At 4:32). Era uma Igreja que quando orava, o lugar tremia, mas também era capaz de enfrentar o Sumo-Sacerdote enquanto lider político religioso, como fizeram Pedro e João (At 4:19-20). Era uma Igreja onde os sinais do poder de Deus ocorriam como forma natural, sem qualquer sensacionalismo (At 5:12). Toda energia e entusiasmo espiritual se expressava em ação missionária (At 8:4-7).
Sua ação missionária foi eficiente, pois em poucos anos o Evangelho se espalhou de Jerusalém até Roma, a capital do Império Romano. Levantou homens como Paulo, Silas, Áquila e sua mulher Priscila. Obreiros e obreiras dispostos a dar sua vida pelo Evangelho. Pessoalmente, considero o testemunho de Paulo aos Presbíteros, em Éfeso, um dos mais belos testemunhos de uma vida cheia de Espírito Santo, e por conseqüência, de profunda dedicação missionária, "E agora, constrangido em meu espírito, vou para Jerusalém, não sabendo o que ali me acontecerá, senão que o Espírito Santo, de cidade em cidade, me assegura que me esperam cadeias e tribulações. Porém, em nada considero a vida preciosa para mim mesmo, contando que complete a minha carreira e o ministério que recebi do Senhor para testemunhar o ministério da graça de Deus. Agora sei que todos vós, em cujo meio passei pregando, o reino, não vereis mais o meu rosto. Porém eu vos protesto no dia de hoje, que estou limpo do sangue de todos; porque jamais deixei da anunciar todo o desígnio de Deus." (At 20:22-27). "Portanto, vigiai, lembrando-vos de que por três anos, noite e dia, não cessei de admoestar, com lágrimas a cada um" (At 20:31).
Algo que podemos notar na vida da Igreja Primitiva era a paixão evangelizadora, profundo amor pelas vidas sem Cristo, uma dedicação e consagração ao Senhor Jesus, que anulava todo e qualquer projeto pessoal. São estes sinais fundamentais do Avivamento do Espírito Santo nesta Igreja.
Finalmente a Igreja Primitiva não rompeu com o judaísmo, mas sim seguiu participando do Culto , no Templo. O rompimento deu-se por parte do judaísmo com relação a Igreja; Pedro e os demais apóstolos seguiram freqüentando o Templo (At 3:1), enquanto isto lhes foi permitido. Isto deu valor as tradições do Antigo Testamento, recuperando o sentido real que havia sido deturpado pela interpretação farisaica. Fica claro que todo sentido da revelação de Deus em Cristo, tem sua origem na Tradição Judaica, conforme o Antigo Testamento.
2.c - A vida e ministério de João Wesley.
Não há dúvida que somos herdeiros do maior Avivamento que a Igreja Cristã experimentou na era post-reforma protestante. Tal afirmação procede dos grandes historiadores Metodistas.
O Avivamento de Deus na Inglaterra, de João Wesley, mudou a vida daquele país. Quando este começou, a Inglaterra estava mergulhada em injustiça social, comparável a que temos no Brasil hoje, uma nobreza minoritária controlava totalmente as riquezas da nação, o povo vivia na mais absoluta miséria e ignorância. A religião era foco de frieza espiritual e foco de escândalos imorais, os clérigos eram, em sua maioria, de uma profunda indiferença para com a vida do povo, o qual nem ingresso tinha aos atos da Igreja, tampouco interesse pela fé.
Do solo da Inglaterra, do clima alterado pelo Metodismo, cresceu a colheita humanitária que seria a sua glória. Citando Green: "o resultado mais nobre do reavivamento metodista foi a tentativa constante, que nunca cessou, desde aquele diz até hoje para remediar a culpa, a ignorância, o sofrimento físico, a degradação social dos perdidos e dos pobres... Produziu uma nova filantropia que reformou nossas prisões, infundiu clemência e sabedoria às nossas leis penais, aboliu escravo e deu o primeiro impulso à educação popular.
A melhor evidência do modo como João Wesley modificou o clima espiritual da Inglaterra é a mudança operada na atitude de seus patrícios para com o próprio evangelista. No diário de Wesley temos um registro de 4 visitas bem espaçadas que ele fez em um velho porto marítimo de Falmouth, Cornwall. Elas refletem a influência moderadora do reavivamento naquele lugar.
A primeira visita de Wesley foi em 4 de julho de 1745, quando seu movimento estava apenas começando. Ele havia cavalgado até a cidade para visitar uma mulher doente quando uma multidão, formada principalmente por marinheiros do porto, reuniu-se do lado de fora da porta. Berravam ordenando-lhe que fosse embora. Visto que ele não os entendeu, atiraram-se contra a casa e tiraram a porta dos gonzos. Embora Wesley julgasse que sua vida não estaria valendo nada naquele momento, enfrentou a multidão com sua calma habitual, obtendo uma chance para falar, conteve-os até que algumas pessoas da classe alta o socorreram levando-o em segurança a bordo de um navio. Terminara a visita.
Sua segunda visita foi dez anos depois, em 2 de setembro de 1755. Não houve motim desta vez, nem necessidade de escapar para salvar a pele. A Sociedade Metodista havia construído um edifício por essa época e Wesley conta-nos que pregou a uma congregação "profundamente atenciosa".
Foi a Falmouth pela terceira vez, quinze anos depois, em 30 de agosto de 1770. Desta vez ele não pregou no edifício Metodista, mas perto da Igreja Anglicana. Ele registra que "Falou ao maior número de pessoas que já viu, com exceção do populacho, há 25 anos atrás".
Sua última visita foi em 18 de agosto de 1789. Deixemos que seu diário fale sobre o dia:
"À tarde, como não pudéssemos passar pela estrada comum, procuramos passar por alguns campos e chegamos a Falmouth em boa hora. Na última vez que estive aqui (ele se esquecera das visitas calmas feitas depois), cerca de quarenta anos atrás, fui aprisionado por uma imensa multidão que rugia como leões. Mas como as coisas estão diferentes agora! Grandes e pequenos alinham-se na rua de uma extremidade a outra da cidade, em amor a bondade, clamando uns, espantando outros, como se o rei estivesse passando. À tarde preguei no topo da montanha, a pequena distância do mar, à maior congregação que já vi em Cornwall, exceto em Redrath, ou perto desta cidade. E não tenho presenciado tal acontecimento desde que voltei da Holanda. Deus trabalhou maravilhosamente nos corações das pessoas, de modo que todos parecem conhecer o dia de sua visitação".
Tudo isto começou a ser mudado quando Deus operou, também, uma mudança na vida de João Wesley, que ansiosamente, há algum tempo, buscava agradar a Deus. Wesley era até 24 de maio de 1738 um bom cristão, pastor e missionário, mas a experiência do coração aquecido fez a grande diferença, a qual todo metodista necessita.
Este movimento do Espírito Santo na vida de João Wesley, reavivando a vida e a fé do povo inglês, é nosso legítimo parâmetro. Quando Wesley morreu havia 70.000 metodistas só na Inglaterra, como diz Ensley, talves outros 70.000 tenham morrido na fé durante sua vida, sem falar que nos Estados Unidos da América do Norte já havia perto de 65.000 no final do séc.18. Nós, hoje, estamos devendo uma contribuição de igual impacto social e evangelístico no nosso Brasil. Cremos que somente um legítimo Avivamento Bíblico e Metodista pode suscitar força, coragem e visão missionária para tanto.
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